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Dr. André Gonçalves Fernandes

Coluna "Lanterna na Proa"

MODELOS FAMILIARES: AMOR

André Gonçalves Fernandes

Lewis afirmava que “todo amor humano, em seu apogeu, possui a tendência de reivindicar uma autoridade divina. Sua voz tende a soar como se fosse a vontade do próprio Deus. Ela nos diz para não medir o custo, exige de nós um compromisso total, tenta superar todas as outras reivindicações e insinua que todo ato feito sinceramente “por causa do amor” é, portanto, bom e até meritório. Que o amor erótico e o amor patriótico tentam dessa forma “tornar-se deuses” é geralmente conhecido. Mas afeição familiar pode fazer o mesmo, assim como a amizade, embora de modo diverso (in Os Quatro Amores; Martins Fontes; São Paulo; 2006; 3ª ed.; p.57)”.

De fato, o trem da afetividade, quando anda sem os freios da vontade e da razão humanas, descarrila mais cedo ou mais tarde. Um exemplo contundente está no movimento consumista que assola nossa sociedade nos dias de hoje. O consumismo provoca, no indivíduo, uma maior dependência de estímulos sensoriais e, depois, busca, na ânsia por prazeres, o apoio para vender mais e mais.

A atração pelos prazeres é um movimento elementar da vontade, facilmente manipulável pela via da excitação. Uma vez experimentado o prazer, segundo a imagem projetada na publicidade, a pessoa vai à busca de outro bem consumível que julga apto a lhe satisfazer o desejo, que acaba por “criar” uma necessidade, antes concebida como um simples capricho. Aliás, quando era menino, minha avó vivia me dizendo que os caprichos de hoje podem se transformar nas necessidades do amanhã...

Com efeito, o afeto, se, por um lado, permite a constituição de relações familiares, de outro, é insuficiente para a consolidação de uma estrutura familiar genuína. Se os afetos são cambiantes por natureza, como um vento que muda de direção neste ou naquele momento, pretender solidificar uma relação que se pretende duradoura num lastro exclusivamente afetivo é o mesmo que colocar uma lanterna na popa: só iluminará as ondas que deixamos para trás. A navegação até um porto seguro continuará às cegas.

Para isso, é necessário colocar a lanterna na proa: o amor, que não se confunde com o mero sentir-se bem, mas com o comprometer-se, com o doar-se e, para tanto, para alcançar o outro, para transcender-se, a pessoa precisa agir, harmoniosamente, com a inteligência (imagem do ideal), a vontade (ação livre na causa) e a afetividade (pulsão ordenada pela dimensão ética do ser).
                  
A união conjugal decorrente do casamento, conforme entendemos, tem uma antropologia implícita: diversidade sexual, igual dignidade dos cônjuges, complementaridade e abertura à procriação, alimentada pela natural atração entre homem e mulher e sobre a qual se articula a livre vontade de ambos, fundada pelo amor e não pela simples afetividade, à doação e aceitação mútua.

Por consequência, o amor verdadeiro e livre entre um homem e uma mulher, se, antes do matrimônio, era um amor eletivo, depois da realização deste, transforma-se em um amor devido por justiça.

O compromisso então nascente entre os cônjuges, além de moral, é jurídico e consiste na manifestação de um amor responsável, porquanto zela pela própria duração em benefício de ambos os consortes, dos eventuais filhos e da sociedade. O amor sustentado sobre o matrimônio não se limita a uma mera expressão de afetividade ou à volatilidade e o tumulto das emoções, o sentimentalismo, essa atitude imatura, fruto da deturpação da afetividade, que fez de nossa sociedade sua principal refém.

Penso que o amor humano pleno, em quaisquer de suas formas, não somente no amor esponsal, é oblativo. Não me parece possível que a justaposição de dois egoísmos possa engendrar algum tipo de amor, ao menos digno de tal nome. Afinal, já disse uma famosa atriz americana ser mais fácil amar vinte homens durante um ano a amar um único homem durante vinte anos. Salvo melhor juízo, é o que penso.



casal

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ANDRE GONÇALVES FERNANDES, Post-Ph.D. Juiz de Direito e Professor-Pesquisador. Graduado pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (USP). Mestre, Doutor e Pós-Doutorando em Filosofia e História da Educação pela UNICAMP. Juiz de direito, titular de entrância final em matéria cível e familiar, com ingresso na carreira aos 23 anos de idade. Pesquisador do grupo PAIDEIA-UNICAMP (linha: ética, política e educação). Professor-coordenador de metodologia jurídica do CEU Escola de Direito. Coordenador Acadêmico do Instituto de Formação e Educação (IFE). Juiz instrutor/formador da Escola Paulista da Magistratura (EPM). Colunista do Correio Popular de Campinas. Consultor da Comissão Especial de Ensino Jurídico da OAB. Coordenador Estadual (São Paulo - Interior) da Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS). Membro do Comitê Científico do CCFT Working Group, da União dos Juristas Católicos de São Paulo (UJUCASP), da Comissão de Bioética da Arquidiocese de Campinas e da Academia Iberoamericana de Derecho de la Familia y de las Personas. Detentor de prêmios em concursos de monografias jurídicas e de crônicas literárias. Conferencista e autor de livros publicados no Brasil e no Exterior e de artigos científicos em revistas especializadas. Membro Honorário da Academia de Letras da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. Titular da cadeira nº30 da Academia Campinense de Letras.

E-mail: agfernandes@tjsp.jus.br

Publicado no Portal da Família em 21/07/2011

 

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